segunda-feira, 1 de junho de 2009

Crónicas da Revelação - Capítulo II

- Shhhh! Ainda o acordas!
- Mas se ele está desmaiado, não vai acordar assim tão depressa!
- Vá lá! Eu quero é saber o que aconteceu à Rainha Jewya!
- Estou tão impaciente!
- Vá, silêncio e nem uma palavra, senão…
Uma das fadas do Ar abriu a porta muito devagarinho e sem barulho. Estava consciente do motivo que a levara até ali: a Líder das Fadas do Ar, Lawrry, enviara-as para saberem o que se tinha passado com a Rainha para ela não ter regressado.
Cochichando, deram as mãos, fazendo um círculo as pés da cama, concentrando-se numa coisa só: as recordações do Rei.
Uniram as forças, tentando penetrar na mente de Lordgok, mas este era demasiado poderoso. Esforçando-se ao máximo, as pequenas fadas tentaram e tentaram, e finalmente, conseguiram algo: a visão mais recente do Rei.
As fadas perscrutaram-na esperando saber o que se passou, mas logo se arrependeram, pois o que viram escandalizou-as: a sua rainha, a mais querida e adorada, estava morta.
Horrorizadas e enfurecidas, as fadas interromperam a ligação, mais brancas que cal, e saíram do quarto de rompante, batendo a porta com um estrondo, acordando o Rei.

Alto, de olhos verdes e apaziguadores, Liurath caminhava lentamente pelo corredor, quando avistou as fadas a saírem repentinamente do quarto do irmão.
“Mas o que estão elas a fazer aqui?” pensou Liurath, com uma expressão estranha. Desconfiou que tinham vindo espiar.
Virou à esquerda e bateu à porta. Ninguém respondeu. Então, abriu-a e ficou espantado ao constatar que o rei estava acordado, sentado na cama, de olhos vazios. Sem mais nem menos, Liurath perguntou:
- O que aconteceu à Rainha?
Lordgok virou-se e disse, numa voz rouca:
- Olá.
Alguns instantes depois, respondeu:
- Não me lembro. Não me lembro de nada. Só de chegar lá, de uma névoa branca …humm… e de acordar com um estrondo.
“Estranho e interessante…” reflectiu Liurath, e disse:
- Mas não te lembras mesmo de nada? Não sabes o que se passou com Jewya? Vá lá, alguma coisa tens de saber, andam todos intrigados com o desaparecimento dela. Vá, faz um esforço!
De repente, o rosto do Rei contorceu-se de dor, os olhos ainda vazios e inexpressivos. Parecia que algo o assombrava, embora não estivesse ninguém no quarto excepto ele e o irmão.
- Lembro-me de estar num lugar… – afirmou com dificuldade, Lordgok. – Não! Não é possível! – Quando se apercebeu do que via, a sua cara contorceu-se de dor e choque, e nos seus olhos era possível ver-se vestígios de lágrimas. – Ela não pode… NÃO PODE!!! Como pode estar morta? Porquê? Eu não sei… – Aí, Lordgok levantou-se num repente e começou a gritar com Liurath. – Porque é que não me consigo lembrar? Porquê? Diz-me!
Liurath pôs ambas as mãos nos ombros do Rei e disse, numa voz calma e serena:
- Acalma-te, irmão. Decerto as poções da Fonte Eterna te poderão curar e ajudar-te-ão a lembrares-te de tudo. Embora eu desconfie de que as fadas já saibam que Jewya está… bem, morta.
Lordgok pareceu mais calmo, o que permitiu ao irmão informá-lo de que todos os deuses e fadas sentiam uma crescente ansiedade e curiosidade em saber o eu se passava com a Rainha e que era bem possível de que a notícia já se tivesse começado a espalhar por toda Aernet por meio das fadas.
***
O Sol raiava, espalhando luz por toda a cidade, mas o ambiente em que se vivia sugava a sua alegria, transformando-se em revolta.
Nos portões do Palácio, as fadas reuniam-se, protestando contra a atitude do Rei, chefiadas por Lawrry, a Líder das Fadas do Ar.
- E agora, todas comigo. Não queremos o Rei!
- Não queremos o Rei!
- Queremos segurança!
- Queremos segurança!
- Queremos alguém justo!
- Queremos alguém justo!
Nesse momento, os portões abriram-se e uma mulher de cabelos brilhantes como o Sol e de uma expressão serena saiu: a Deusa da Paz. Levantou os braços de forma apaziguadora e disse, dirigindo-se a Lawrry:
- Acalma-te, pois não há razão para tanta euforia. Tudo se resolverá a seu tempo. Se têm algo a dizer, sugiro que o digam a Liurath, é ele que está encarregue da gestão da Aernet.
Então, uma segunda figura, de andar altivo, saiu do Palácio e veio ao encontro das fadas. Liurath fez um gesto como que a tentar acalmar a onda de fúria que se sentia, e anunciou:
- A vossa opinião terá uma grande força na decisão do futuro de Aernet. E falo por todos quando digo, obrigado por manifestarem o vosso desejo. Tomaremos a decisão no dia 44 do Equinócio de Outono, pela madrugada. Mais uma vez, obrigado.
Não deu a hipótese das fadas falarem e voltou a entrar no Palácio.
As fadas perceberam que não adiantariam nada se continuassem a revolta, dispersaram-se e continuaram as suas tarefas. Por fim, tudo voltou à normalidade. Pelo menos, por enquanto.